A última badalada
Para o senhor Antunes, a Dona Joaquina era como se fizesse parte da mobília. Lembrava-se dela quando vinha ao escritório pela mão do pai, e agora ali estava ele, Chefe de Secção, já próximo da reforma, e ela sempre com a mesma bata aos quadrados, o cabelo enrolado num carrapito, a vassoura e o pano do pó nas mãos.O dia ia decorrendo na modorra habitual quando começaram a bater as badaladas do meio-dia no velho relógio de parede. Era um relógio de pêndulo, muito preciso, e Vicente, o segundo escriturário, era quem tinha por missão dar-lhe corda duas vezes por semana. Ao soar a última badalada, as luzes acenderam e apagaram, os telefones tocaram ao mesmo tempo, o telex começou a martelar, e a chaleira na mesa do canto a apitar. Depois ficou tudo em silêncio e ouviu-se uma voz: “Luciva, a pena de exílio a que foste condenada terminou. Espero que tenhas aprendido com este castigo. Podes voltar para junto de nós.”
Ouvindo estas palavras, Dona Joaquina gritou “Yesssss!”, cavalgou a vassoura, voou duas voltas ao escritório e saiu pela janela que se tinha aberto sozinha para lhe dar passagem.
Todos os funcionários ficaram de boca aberta. E Antunes começou a pensar como iria explicar ao Esteves da Secção de Pessoal o desaparecimento de uma funcionária…
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