O TESOURO
Era sabido por todos que Khalil El-Amin, o bisavô do actual Sultão, tinha mandado construir nos jardins do palácio um Pavilhão onde, era voz corrente, estava guardado um tesouro.Na sala do trono havia uma caixa com incrustações de madrepérola que, toda a corte dizia, continha a chave do Pavilhão. Na tampa da caixa tinham sido gravadas instruções para só ser aberta no dia em que passassem cem anos sobre a morte de Khalil.
Nesse mesmo dia, a caixa foi solenemente transportada para a frente do Pavilhão, onde tinha sido erigida uma tenda para albergar o Sultão e a corte mais próxima.
Aberta a caixa, uma reacção de surpresa percorreu todos os que assistiam. Na caixa não havia nenhuma chave, mas um pergaminho onde estava escrito:
“Não forçareis a porta, nem usareis chave para a abrir.”
O Sultão consultou o seu círculo de conselheiros, que concluiu que a solução do problema estaria provavelmente na utilização de magia. E logo foi publicado um édito, proclamando que o Sultão daria metade do tesouro guardado no Pavilhão àquele que conseguisse abrir a porta.
E muitos magos vieram de todas as províncias do sultanato, mas a porta manteve-se inamovível a todos os encantamentos contra ela pronunciados. E todos os magos e feiticeiros, humilhados, foram forçados a desistir.
O Sultão decretou então que qualquer súbdito teria direito a tentar abrir a porta. Mas quem se atrevia, depois de poderosos magos terem falhado? E a multidão em torno do Pavilhão mantinha-se expectante.
Foi então que uma voz se ouviu: “Eu gostaria de tentar, oh Comandante dos Crentes!”
E um rapaz pobremente vestido furou por entre a multidão e aproximou-se até uma distância respeitosa do Sultão, mantida pelos soldados da guarda pessoal.
“Como te chamas?”, perguntou o Sultão.
“Ali-Babá, Vossa Alteza”, disse o rapaz fazendo uma vénia.
“Qualquer um dos meus súbditos pode tentar. Avança!”
O rapaz foi a um arbusto que florescia junto da porta do Pavilhão e cortou um raminho. Limpou-o das folhas, introduziu o raminho na fechadura da porta, torceu para um e outro lado e ao fim de poucos segundos, empurrou a porta que, para espanto de todos os presentes, se abriu suavemente sem ruído.
Ali-Babá recuou, virou-se para o Sultão e com uma vénia, convidou-o a entrar no Pavilhão.
“Nem vou perguntar-te onde adquiriste a perícia necessária para o que acabas de realizar”, disse o Sultão ao rapaz, antes de transpor a porta.
Já dentro, nova surpresa. O interior do Pavilhão, constituído por um único compartimento, estava essencialmente vazio, apenas com uma mesa sobre a qual se encontravam duas vasilhas seladas e um livro. E um rolo de pergaminho.
O Sultão entregou o pergaminho ao grão-vizir para que o lesse. E este leu:
“Não era provavelmente o que esperáveis, mas é este um tesouro maior que qualquer outro. Aqui dentro tendes água, trigo e um livro. Água, Comida e Conhecimento. Existirá maior tesouro na face da Terra?”
O Sultão dirigiu-se à multidão: “Sábias palavras as do meu bisavô.”
Falou depois para Ali-Babá:
“Permite-me que guarde o livro que pertenceu ao meu antepassado. Poderás ficar com o resto do tesouro.”
O rapaz rompeu os selos da vasilha de água, levou-a à boca e bebeu longamente. Pegou depois na vasilha de trigo e despejou-a até ao último grão num bornal que trazia ao ombro. Dirigiu-se então ao Sultão, ajoelhou, pegou-lhe nas mãos e beijou-as.
“Obrigado, oh Comandante dos Crentes!”
Levantou-se, fez outra vénia e afastou-se, misturando-se com a multidão.
Quando já estava suficientemente longe, abriu as mãos: na palma da mão direita brilhava um anel de ouro, com um enorme rubi, que minutos antes ornamentava o dedo indicador da mão esquerda do Sultão. Na outra mão de Ali-Babá refulgia uma pulseira de prata finamente trabalhada, ornamentada com granadas e safiras, que o Sultão usava no pulso direito em ocasiões especiais.
Ali-Babá olhou para os objectos, deu uma gargalhada, fê-los desaparecer numa das múltiplas algibeiras da sua túnica andrajosa e mergulhou nas ruas da kasbah, fervilhantes de gente, onde a sua presença se desvaneceu em poucos segundos…
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