Vida (quase) eterna
Eram os dez homens mais ricos do planeta. No conjunto, possuíam mais de 95 por cento da riqueza da Terra. Eram também responsáveis, através de decisões suas ou de empresas que dominavam ou de governos que controlavam, por quase tudo que sucedia aos habitantes do planeta.
Com uma pequena parcela das suas incomensuráveis fortunas, financiaram um Instituto de Investigação destinado a estudar o prolongamento da vida.
Ao fim de alguns anos, o Instituto produziu o primeiro resultado: um método de hibernação perfeito. As experiências, primeiro em animais, depois em voluntários pagos, mostraram que era possível colocar seres humanos de forma segura em animação suspensa.
Decidiram pôr-se a si próprios nessa condição durante um período de 500 anos. De acordo com as melhores projecções, esse período seria suficiente para que os maiores génios do mundo, a trabalhar no Instituto, descobrissem o tratamento de que resultaria a imortalidade.
No interior bem protegido de uma montanha, uma sala circular alojava os dez sarcófagos criogenados, com os respectivos sistemas de suporte de vida. Uma pequena central nuclear fornecia a energia necessária ao funcionamento de todo o complexo.
Um erro de programação fez com que o prazo para o despertar fosse fixado, não em 500, mas em 5000 anos.
Três mil anos após o início da hibernação, o planeta estava moribundo. Os recursos esgotados, o ar, a terra e os rios e mares poluídos, a população em rápido declínio... Mas aqueles que tinham sido os dez homens mais ricos da Terra continuavam a dormir o seu sono de séculos...
Passaram mais mil anos, e o leilão do sistema solar deu o resultado que era previsto. As melhores peças – a cintura de asteróides com os seus minerais extremamente valiosos, as luas de Júpiter ricas em hidrocarbonetos – foram arrematadas por poderosas confederações planetárias. O terceiro planeta, praticamente morto, foi comprado por um planeta longínquo, por um valor marginalmente superior ao preço base de licitação.
O chefe de projecto examinava os planos de construção da unidade
offshore que ia ser montada para extrair metais da água do mar. Fazer recuperação de resíduos à escala planetária era uma actividade complicada: cumprir prazos utilizando equipamento de segunda e mão de obra pouco qualificada – ninguém queria vir enterrar-se num planeta morto a anos luz de casa. Neste caso particular, o único ponto favorável era que, devido à estupidez dos nativos entretanto desaparecidos, os teores de metais valiosos nos oceanos eram extremamente elevados.
A sua linha de pensamento foi interrompida pelo aparecimento de um subordinado que, depois de uma saudação ritual apressada, informou:
“Chefe, descobrimos a origem dos sinais que estávamos a obter. É uma pilha radioactiva, que ainda tem umas largas centenas de anos de vida útil!”
“Finalmente uma boa notícia! Retirem-na do local onde está e montem-na na nova unidade de extracção.”
Mas há um problema, chefe. A pilha está a alimentar o sistema de suporte de vida de dez sarcófagos que estão numa câmara escavada naquele bloco rochoso...”
“E o que está nos sarcófagos? Material orgânico, não é? Descarreguem o conteúdo nos tanques de alimentação da central hidropónica. Neste miserável planeta precisamos de todos os nutrientes que conseguirmos arranjar!”